João Rodrigues, 67 anos. Num dia em que não tinha muito tempo para procurar um ‘Estranho’ olhei para o lado e reparei no João, encostado a um muro, a aproveitar um momento de sombra para se proteger do calor infernal que se fazia sentir em Fátima. Quando lhe expliquei o projeto, ele fez logo questão de me alertar que é pedinte. Fiquei na dúvida se essa era a forma de dizer que não estava interessado. “Sabe, normalmente, quando digo isso às pessoas, acabam por se afastar ou serem mal-educadas”, diz, de forma a explicar porque começou por dizer isso. Expliquei-lhe que podia ficar descansado que esse não iria ser o caso. É natural de Peniche mas mudou-se para Fátima, há cerca de 30 anos, para trabalhar no ramo dos móveis. Foi impossível não reparar nas suas muletas e perguntei-lhe o que tinha acontecido. “Tive um acidente de carro em 2009. O condutor nem ficou muito mal, mas eu não tive a mesma sorte porque o meu cinto rebentou. Acordei no Hospital, quatro dias depois. E começaram os problemas. Fiquei incapacitado e sem conseguir trabalhar. E, além do mais, o carro nem tinha seguro”, contou, visivelmente emocionado. Mas sublinhou que, apesar de tudo, decidiu continuar a lutar. “Por várias vezes que me passaram pela cabeça os pensamentos menos positivos, mas parecia que ‘alguém’ me dizia para continuar, entende?”, confessou, apontando para o céu. Na medida dos possíveis, disse ainda, foi dando utilidade aos conhecimentos que adquiriu na sua profissão. “Moro numa barraquinha sem água e sem luz mas fiz uma cama para ter um mínimo de conforto. E tive algumas ajudas de pessoas a quem ficarei eternamente grato. Agora, vivo das esmolas. Desde que dê para comprar pão, leite e salsichas, basta-me”, revelou. Como sabe que não pode pedir esmolas no recinto do Santuário, acaba por ficar nas zonas da entrada para o recinto. E aí, revelou, as pessoas, por vezes, respondem-lhe mal. “Compreendo que as pessoas têm dias maus mas muitos dos que aqui andam não tem fé nenhuma. Não são obrigados a ajudar mas tratar mal é coisa que não entendo”, afirmou João. Como o meu tempo a ficar escasso, acabei por pedir desculpa por ter de me ir embora e despedi-me. O João sorriu e disse: “Obrigado por este bocadinho e o mais importante é viver um dia de cada vez”.
Fátima, 15 Agosto 2016
Rui Miguel Pedrosa
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