Manuel Serrano Lopes, 73 anos. O assunto que o senhor Manuel quis falar foi relativa a uma altura que o marcou imenso. É ex-combatente do Ultramar. “Lembro-me de tudo. Tinha 21 anos e embarquei, no paquete Vera Cruz, no dia 5 de Dezembro 1963. Ia integrar o batalhão 557 na companhia 545. Eramos operacionais. A minha especialidade era atirador da infantaria, mas no Ultramar eramos chamados por caçadores”. Perguntei se ia preparado para o que ia encontrar: “Iamos preparados para tudo. Até para morrer”. Quando questionei o que tinha sido a primeira coisa que viu quando chegou, respondeu: “Olha, encontrei miséria. E tristeza. Quando desembarcamos, em Luanda, tínhamos como missão a ir combater no norte de Angola. Era, precisamente, onde havia mais zonas de combate. Nas primeiras noites ficamos logo todos picados pelos insectos. Era impossível fugir aqueles insectos”. Perguntei-lhe qual tinha sido o episódio que o tinha marcado mais. “Estivemos algumas vezes em perigo mas, aquela vez que me marcou mais, foi, precisamente, o primeiro obstáculo que encontramos. Estávamos na ‘Fazenda das Motas’ e ouvimos tiros. Fomos a correr para o local e quando lá chegamos vimos que tinha sido um ataque a um camião que transportava sacos de café. Infelizmente, o motorista morreu logo. E como era natural naquelas situações estávamos em alerta e a proteger-nos. Mas quando houve tiros na nossa direcção a nossa reacção foi disparar no sentido onde nos parecia que vinham os tiros. Mas obviamente nem víamos nada. Era mesmo disparar a toa. Tivemos sorte e nenhum nos atingiu. Mas era a primeira vez que estava naquela situação. Foi um susto valente. Naquela noite nem dormi”. Revela que depois dessa vez esteve diversas vezes em situações de perigo mas “felizmente nunca fui ferido. Mas sofri bastante. Só no meu batalhão morreram 12 homens”.
“A 19 de Março 1966 veio embora, no barco Quanza. A viagem demorou 15 dias. A alimentação era péssima, por exemplo, comida podre e a cheirar muito mal. Foi uma viagem terrível. Emagreci tanto que quando cheguei a minha terra nem me conheciam”. Perguntei-lhe o que sentiu quando chegou de regresso a Portugal, e responde: “senti uma alegria enorme. Só o facto de saber que estava livre da guerra era um alivio”.
Leiria, 20 Fevereiro 2016
Rui Miguel Pedrosa
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