Armindo Faustino, 56 anos. Desta vez procurei o meu estranho do dia num local diferente. Achei que seria interessante ouvir as histórias de alguém que trabalhasse nesse meio. Desloquei-me a um cemitério. O senhor Armindo é coveiro. Pedi-lhe que me contasse como entrou na profissão. "É claro que nunca pensei que algum dia viria a trabalhar aqui. Era operário fabril, mas concorri a um concurso público para trabalhar na Câmara Municipal de Leiria. Na altura havia apenas duas vagas - uma nos sanitários públicos e outra aqui no cemitério". Quis saber a razão da escolha. Explicou-me que não gosta de trabalhar sozinho e que no cemitério iria trabalhar em equipa. "A primeira 'cova' custou-me um bocado a abrir, aliás, actualmente, 31 anos depois, ainda custa. Tive de me mentalizar que era para enterrar pessoas. Mas sabe, temos que o fazer". Sobre os perigos da profissão, esclarece que é preciso muita cautela no manuseamento das terras, para que não aconteçam imprevistos indesejáveis. "Quando estamos a abrir a cova temos de ter cuidado porque as terras podem 'esborrar' (desabar) e ficamos lá nós presos". 
Confessa que já abriu 'covas' para pessoas que lhe eram conhecidas e que isso o deixa sempre triste. "Apenas no momento em que chega a cerimónia é que sabemos quem vamos 'tapar'. Mas temos de o fazer. Alguém tem de o fazer. Aqui é necessário algum sangue frio. Sinto-me sempre triste nessas alturas". E finaliza a dizer: "Apesar de lidar com a morte ainda não me consegui habituar e não gosto de falar dela. Quem gosta?".

Leiria, 22 Janeiro 2016
Rui Miguel Pedrosa