António Moreira, 52 anos. Há algum tempo que esperava a oportunidade para o abordar. É hábito vê-lo a andar, com a mochila às costas, pela cidade de Leiria. Mas fiquei sempre na dúvida se seria português. "Sou português, mais precisamente de Penafiel. Por onde quer que comece? Pela parte que me tentaram matar quando tinha 2 anos?”. Confesso que fiquei desconcertado. Pedi, então, para começar pelo início. “Não sei quem são os meus pais. Nem nunca soube nada deles. Fui criado por pessoas que, além de me terem atirado de um 2º andar, me maltrataram e escravizaram”, desabafou, com as lágrimas nos olhos. Gerou-se um silêncio constrangedor, até eu me recompor e conseguir formular a pergunta seguinte. Como fez para se livrar desse ‘terror’?. “Tive de fugir quando tinha 21 anos. Mas, sinceramente, um dia, gostava de saber quem são os meus pais”.
António ficou a viver na rua, depois da esposa falecer, em 2006. “Fomos casados 13 anos. É muito difícil perder alguém que amamos e não o desejo a ninguém. Perdi o gosto de viver e andei desamparado, sem saber o que fazer. Luto todos os dias para ganhar algum gosto pela vida, mas não é fácil. E olhe, acabou por dar no que vê à sua frente”. Costuma dormir numa casa abandonada, por ser um local calmo, onde ninguém o chateia e, pretende um dia, ir viver para Torres Vedras, por gostar imenso da cidade e acreditar que pode ter um quarto. “Sabe, é muito fácil ficar sem nada e ir parar à rua”, disse-me, emocionado, pedindo desculpa por estar a ocupar o meu tempo. Respondi-lhe que tinha todo o tempo do mundo. Pousei a máquina e estivemos à conversa cerca de hora e meia.
Leiria, 24 Janeiro 2016
Rui Miguel Pedrosa
3 Comentários
Uma história de vida que valoriza muito o pouco que temos.. Excelente. parabéns.
ResponderEliminarUma história de vida que valoriza muito o pouco que temos.. Excelente. parabéns.
ResponderEliminarparabéns...que trabalho lindo! olhar o interior mais profundo de um simples "estranho"
ResponderEliminarMais uma vez parabéns