António Couto, 61 anos. Começou por me dizer que faz parte da família Couto, de São Martinho do Porto, conhecida por ter sido "das primeiras a povoar a zona centro do país". E que ali residiu até aos 18 anos. “Saí de lá, para a marinha marcante. O que me permitiu navegar por todos os oceanos do mundo. Ainda hoje, amigos que conheci dessa altura, entram em contacto comigo. Mesmo quando eu pensava que nunca mais se iriam lembrar de mim”. Percebi, de imediato, que teria imensas histórias para contar, mas pedi-lhe a mais especial. “Olhe, foi uma história a modos que polémica, quando comecei como estagiário no navio Niassa, que ia levar os últimos contingentes de militares portugueses para a Guiné-Bissau. No dia do embarque, houve um atraso de duas horas, para arrancar com o navio. Coincidência, ou não, antes de arrancar, rebentaram duas bombas a bordo. Ficámos todos cheios de medo. A parte da polémica foi quando o governo encobriu tudo ao dizer ao povo que o navio estava em perfeitas condições para navegar. E nós, a ouvir aquela mentira na rádio, quando ainda estávamos na costa, junto ao Forte de São Julião da Barra, com os mergulhadores a reparar o navio. Se fosse, em alto mar, tínhamos morrido todos. Depois dos danos reparados, arrancámos em direcção à Guiné. Eu, estagiário, ainda nem sabia bem o que havia de fazer. Mas uma das minhas tarefas era dar alimentação a quatro presos políticos que iam a bordo. E recordo-me muito bem, através deles, que devo ter sido dos poucos a ter conhecimento do golpe de Estado que estava a ser preparado”. 

Leiria, 29 Janeiro 2016
Rui Miguel Pedrosa