Jacinto Gil, 83 anos. Começou por me dizer que a vida dele “tem muito que se conte”. E foi nesta altura que o meu interesse aumentou. É natural de Carvide, mas reside em Leiria, desde os 12 anos. E foi precisamente por aí que a conversa teve início. Veio estudar para padre, no seminário de Leiria. “Exerci o sacerdócio durante 18 anos, mas pedi a demissão”, conta. Foi na altura das obras da Sé de Leiria que tudo aconteceu. E a razão: “Não consegui aceitar que o clero me chamasse ladrão, coisa que nunca o fiz, nem farei”. E, por isso, decidiu abandonar o sacerdócio. "Houve algumas peripécias, nessa altura, porque não queriam que eu o fizesse. Queriam que fosse exercer para o Algarve ou para a Alemanha”, mas “o meu orgulho falou mais alto e não aceitei”, recorda. Demorou algum tempo até conseguir que o pedido de demissão fosse aceite. "Actualmente, ainda sou padre, mas não exerço. Vou continuar a viver a minha fé porque pertenço à igreja de Cristo”. A vida continuou. “Casei aos 44 anos, para não estar sozinho na vida, com a minha senhora, até hoje”. Questionei como é que, naquela altura, tinha conseguido casar, depois de ter sido padre. Confessou que “foi especial”, teve de ser um amigo dele a casá-los. “Obviamente que casei pela Igreja”. Soube mais tarde, que esse padre amigo, que os tinha casado, "sofreu algumas represálias" por o ter feito. O Senhor Jacinto considera que os padres "deviam ser livres para casar, se assim o entendessem. O celibato não devia existir, devia haver liberdade”. Falou-me da época do Salazar e de como seria a vida, se ele ainda fosse vivo. “Na altura, não havia liberdade mas, na realidade, hoje em dia também não há”. E quando a conversa se centra nos políticos de hoje, a sua opinião surge espontânea: “perdoe-me a expressão mas raio que os parta”.
Leiria, 27 Dezembro 2015
Rui Miguel Pedrosa
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