José Ramos, 60 anos. No dia em que as redondezas do estádio de Leiria fica repleto das cores nacionais num sinal de demonstração de apoio a selecção de Portugal decidi ir falar com um dos vendedores de cachecóis que todos os jogos tentam ganhar algum dinheiro extra. O José, junto com a sua esposa, é um dos vendedores que percorre o país, em todos os grandes ‘derbys’. Chegam horas antes de cada jogo para se posicionarem da melhor forma. “Olhe, faço-o porque sou reformado por invalidez e quem é que sobrevive com uma reforma de 200 e poucos euros? E junto com o pouco que se vai fazendo vai dando para sobreviver. Comecei a faze-lo no Euro 2004. E olha o motivo que me fez ficar reformado é que é a grande revolta da minha vida. Nos anos 80, fui a médica de família porque andava com uns sintomas estranhos. E ela apenas dizia que eu era novo demais e que não tinha nada e acabava por me receitar comprimidos para a dor de cabeça”, conta José demonstrando alguma exaltação notória. Até que em 1995, os sintomas começaram a agravar afectando a visão e a audição e dirigiu-se a um médico particular. “Obrigou-me a ir imediatamente, senão chamava uma ambulância para me levar ao hospital. Nunca mais me irei esquecer das palavras no momento em que me dizem ‘tens um bicho na cabeça’ e que se continuasse sem ser operado que apenas teria 6 meses de vida. Foi mesmo com estas palavras. Nem quis acreditar”, revela com emoção. Mas o médico avisou logo que iria ficar com algumas repercussões causadas pelo tumor e a intervenção cirúrgica. “Quando acordei nem me quis ver ao espelho. O médico bem que me avisou. Fiquei surdo e com paralisia facial do lado direito. Nem parecia eu. A minha mulher e filhas passaram por mim, no corredor, nem me conheceram. Naquela altura sentia uma raiva enorme daquela médica de família que sempre ignorou os sintomas. Por causa dela fiquei assim, está a ver?”, diz enquanto aposta para a cara. Depois de contar isto o José agradece a conversa e diz que não pode estar ali mais na conversa senão não vende nada. Tendo apenas voltado para trás a perguntar o nome do projecto e a agradecer o que fazíamos.
Leiria, 25 Março 2016
Rui Miguel Pedrosa
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